TRF3 09/11/2017 | Folha | 381 | Publicações Judiciais I - Interior SP e MS | Tribunal Regional Federal 3ª Região
É o relatório. Fundamento e decido.
Nos termos do artigo 5º, LXIX, “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for
autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.
A norma constitucional torna estreita a via do “mandamus” ao exigir, para sua concessão, que se tenha direito líquido e certo, como já fazia a Lei n. 1.533/51 em seu artigo 1º, atualmente substituída pela Lei n. 12.016/2009.
Hely Lopes Meirelles, referindo-se a esse dispositivo recorda que “quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no
momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança” (Mandado de Segurança. 26 ed.
Atualizada por Arnoldo Wald e Gilmar F. Mendes. p. 37).
Do que se depreende dos autos, não deve ser acolhida a pretensão do impetrante.
Segundo comprovado pela autoridade aduaneira, as mercadorias foram apreendidas em razão de infração sujeita à pena de perdimento, tendo em vista que a fiscalização concluiu pela prática de infração de uso de
documento falso no despacho aduaneiro (PAF nº 11128.721216/2017-49), com protocolo em 12/04/2017.
Segundo informado, a seleção da operação de importação objeto dos presentes autos para o canal especial de verificação, inicialmente, foi motivada com o fim de apuração dos preços declarados, sendo que, no curso do
processo administrativo, verificou-se a utilização de documento falso, consistente na fatura comercial.
Colaciono, pela clareza, o trecho das informações prestadas pela autoridade coatora, que segue:
“Em análise preliminar, a fiscalização constatou que os preços registrados da DI para dois tipos de produtos declarados em duas adições distintas (003 – caixa de direção e 006 –
corrente de transmissão) estavam aquém dos valores médios informados em declarações de importação pretéritas, registradas por importadores distintos, através das quais foram
nacionalizada mercadorias similares, provenientes do mesmo país de origem. Esse fato levantou suspeita quanto à veracidade dos valores informados na DI nº 16/2020515-9.
Com base nas informações coletadas, instaurou-se o pertinente Procedimento Especial de Controle Aduaneiro (PECA) previsto na Instrução Normativa RFB nº 1.169, de 29 de
junho de 2011, para verificação da irregularidade prevista no art. 2º, inciso I, da referida Instrução Normativa:
...
Ato contínuo, a empresa foi intimada a apresentar documentos e prestar esclarecimentos relacionados à transação comercial, ao tempo em que foi cientificada da instauração do
Procedimento Especial de Controle Aduaneiro.
Em resposta á intimação, a empresa apresentou os documentos: cópias da fatura proforma, de lista de preços, de troca de e-mail e de apólice de contrato de seguro das mercadorias
importadas. Não foram apresentados documentos que dessem amparo a alguma condição especial de negociação e que justificassem a discrepância entre os valores registrados na DI
e aqueles praticados por outros importadores para o mesmo tipo de mercadorias provenientes do mesmo país de origem e com mesma classificação fiscal.
A fiscalização notou que a fatura apresentada em Instrução ao despacho continha flagrante divergência entre a empresa que consta como exportadora dos produtos e a empresa que
consta como signatária do documento. Na fatura apresentada consta como exportadora a empresa chinesa Jiangsu Forlong International Trade Co. LTDA, contudo quem assina o
documento é outra empresa, Jiangyin Kryon Import & Export Co, Ltd.
...
Conforme descrição dos fatos do auto de infração formador do PAF nº 11128.721216/2017-49, não consta do principal documento de instrução do despacho de importação, aquele
que contém, dentre outras informações, as quantidades e descrição dos produtos, os valores das mercadorias que servirão de base, em última análise, para o cálculo dos tributos
devidos, a assinatura do emitente, que é a empresa Jiangsu Forlong Internacional Trade Co., LTD. O que se verifica de fato na fatura comercial é o carimbo e assinatura de outra
empresa (Jiangyin Kryon Import & Export Co. Ltd). A teor da descrição dos fatos no auto de infração, esse fato, além de estar em total desacordo com o previsto na legislação
aduaneira, deixa de garantir a veracidade das informações ali constantes, informações estas que foram inseridas na Declaração de Importação apresentada à Receita Federal do
Brasil. Do Decreto nº 6.759, de 2009 (Regulamento Aduaneiro):
Art. 553. A declaração de importação será instruída com (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 46, caput, com a redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1988, art. 2º):
(...)
II – a via original da fatura comercial, assinada pelo exportador;
(...) ( destaques nossos).
A fiscalização constatou também algumas inconsistências formais na fatura comercia, como, por exemplo, a mistura dos idiomas inglês e português, e a presença dos caracteres de
acentuação ‘til’ e ‘cedilha’ em “ÇÃO” e “SÃO”, e números em formato brasileiro, que indicam que o computador que a produziu estava configurado para a língua “pt-br”, forte
indício de ter sido adulterada e/ou produzida no Brasil.
Portanto, além das suspeitas quanto à veracidade da informação relativa aos preços declarados para os produtos, verificaram-se inconsistências formais na fatura apresentada em
instrução ao despacho aduaneiro, e, além disso, não havia como afirmar quem era o responsável pela emissão do documento que ampara a transação comercial de importação, da
qual constou como importador a empresa Sandro Renato Barboza de Oliveira – EPP.
Considerando os indícios de falsificação dos documentos, a fiscalização aprofundou a análise da fatura, principalmente em relação aos valores ali declarados e o dano ao Erário
causado por tal fraude.
...
Em suma, a conclusão da fiscalização foi no sentido de que as inconsistências observadas na fatura comercial de instrução do despacho aduaneiro (exportador x signatário x
idioma) e que os valores apostos no citado documento são irreais, estando todos aquém dos valores médios praticados em operações de importação pretéritas, envolvendo
mercadorias similares às em despacho pela DI nº 16/2020515-9, comprovado por informações constantes dos Bancos de Dados da RFB, e, por conta disso, restou configurada a
prática de falsificação ou adulteração de documento instrutivo do despacho de importação.”
É certo que, nos termos da legislação de regência, o procedimento especial de controle aduaneiro (PECA) tem cabimento na hipótese de suspeita de irregularidades puníveis com
pena de perdimento, como é a hipótese dos autos. Confira-se o teor dos artigos 1º e 2º, inciso I, da Instrução Normativa RFB nº 1.169/2011:
“Art. 1º O procedimento especial de controle aduaneiro estabelecido nesta Instrução Normativa aplica-se a toda operação de importação ou de exportação de bens ou de
mercadorias sobre a qual recaia suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento, independentemente de ter sido iniciado o despacho aduaneiro ou de que o
mesmo tenha sido concluído.
CAPÍTULO I
DOS INDÍCIOS DE IRREGULARIDADE
Art. 2º As situações de irregularidade mencionadas no art. 1º compreendem, entre outras hipóteses, os casos de suspeita quanto à:
I - autenticidade, decorrente de falsidade material ou ideológica, de qualquer documento comprobatório apresentado, tanto na importação quanto na exportação,
inclusive quanto à origem da mercadoria, ao preço pago ou a pagar, recebido ou a receber;
...”.
No mais, em se tratando da suspeita de irregularidades sujeitas à pena de perdimento, tem cabimento a retenção das mercadorias até a conclusão do procedimento de investigação. A medida é prevista no artigo 68 da
Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, a seguir transcrito:
“Art. 68. Quando houver indícios de infração punível com a pena de perdimento, a mercadoria importada será retida pela Secretaria da Receita Federal, até que seja concluído o
correspondente procedimento de fiscalização.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplicar-se-á na forma a ser disciplinada pela Secretaria da Receita Federal, que disporá sobre o prazo máximo de retenção, bem assim as
situações em que as mercadorias poderão ser entregues ao importador, antes da conclusão do procedimento de fiscalização, mediante a adoção das necessárias medidas de cautela
fiscal.”
Outrossim, não há que se falar em liberação das mercadorias mediante caução, porque estas já foram apreendidas, em decorrência da conclusão do processo administrativo fiscal nº 11128.721216/2017-49.
Por sua vez, o artigo 5º-A da Instrução Normativa RFB nº 1.169/2011 estabelece:
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 09/11/2017
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